As terapias alternativas e complementares têm uma história de sucesso válida e muita gente se utiliza delas, com resultado positivos em suas vidas. Algumas delas levam o epíteto “quântico” , entretanto o termo foi excessivamente massificado e e está perdendo o significado pelo seu uso indiscriminado.
Desde os anos 90, aproximadamente, as terapias alternativas fazem uso de termos da cura quântica. Ele veio por meio de físicos respeitados, sobretudo indianos, como Deepak Chopra que viam similaridade dos conceitos da física quântica como o conhecimento milenar da filosofia oriental. Essa ideia se disseminou entre terapeutas, teóricos e autores atingindo o auge com o livro O Segredo de Rhonda Byrne. A partir daí tudo passou a ser “quântico”.
Tenho formação em engenharia eletrônica, mas desde adolescente me interesso por diversas formas de oráculo, do tarot à radiestesia e acabei fazendo vários cursos na área de terapias alternativas inclusive de cura quântica.
Conheço a física newtoniana (a que é usada para construir um carro, por exemplo) e a teoria da relatividade (que foi usada para mandar o homem à Lua) e a física quântica, ao nível que minha primeira profissão exigia. Os equipamentos eletrônicos são baseados em física quântica e você só pode estar lendo isso num computador ou celular porque a mecânica quântica funciona.
Note que eu usei o termo “mecânica quântica”. A mecânica em física é uma disciplina que se preocupa muito com o “como” sem olhar muito para o “porquê”. Um exemplo claro é a mecânica celeste, sei como se movimentam os astros, posso prever seu comportamento, mas não me preocupo muito em explicar como isso acontece, deixando este tipo de pensamento para astrofísica.
Não há muito consenso entre os cientistas sobre a as teorias que embasam a física quântica, mas há consenso em torno da mecânica quântica e assim podemos continuar fabricando chips de computador.
A construção de chips de computador
se vale de conceitos da Mecânica Quântica
A Mecânica Quântica lida com partículas, a partir do átomo. E aí começa a confusão também. Primeiro, mesmo que o conceito de átomo já esteja bem disseminado a nível popular, quando começamos a observar o átomo em si, começamos a esparrar em paradoxos que não podem ser explicados pela física clássica.
Sem entrar em muitos detalhes, vou colocar três dos principais:
1) As variações de energia no átomo ocorrem aos saltos e não de forma contínua. Isso tirou o sono de Max Plank, seu descobridor, que passou vários anos tentando provar que ele mesmo estava errado.
2) A dualidade onda / partícula de um elemento subatômico. Por exemplo, um fóton, partícula associada à emissão de luz. A luz pode ser vista como uma onda eletromagnética ou como uma emissão de partículas.
3) O Princípio da Incerteza de Heisemberg. É impossível saber ao mesmo tempo a velocidade de uma partícula e sua posição. Isso contraria a física newtoniana de forma contundente, já que uma de suas equações básicas envolve espaço e velocidade. Esse princípio gerou uma discussão entre Einstein e Heisemberg, da qual resultou na famosa frase de Einstein: “Deus não joga dados como Universo”. Heisemberg ganhou a parada. Algumas décadas após, Stephen Hawking deu a seguinte resposta: “Joga sim e num lugar onde Ele não consegue ver os resultados”.
O paradoxo da dualidade onda/partícula gerou e ainda gera muita polêmica. Isso porque se um montar uma experiência para provar que a luz é onda, ela vai se comportar como onda e se comportará como partícula se eu quiser provar o contrário. A conclusão a que se chegou foi que depende do observador. Ou seja a luz será aquilo que eu escolher que ela seja.
Quando se percebeu isso, imagine a polêmica.
O Gato de Schrödinger, a moeda e a árvore
Um físico de nome Schrödinger (não me peça pra soletrar) resolveu propor o seguinte problema hipotético:
Um cientista que detesta gatos resolve fazer o seguinte experimento: prende um gato em uma caixa fechada e opaca e pensa: “vou medir a emissão radioativa do urânio. Se ela ocorrer no tempo X, um dispositivo vai inundar a caixa com um gás venenoso. Se não, nada será feito”.
O cientista monta o experimento e fica aguardando a emissão do urânio. Só que o telefone toca. O cientista abandona o laboratório e, enquanto fala ao telefone, o tempo X é ultrapassado.
O gato está vivo ou morto?
Pela física quântica, nem uma coisa nem outra, já uma das duas realidades só vai existir se o cientista fizer uma observação.
Esse problema não tem solução e tem embaraçado muitos físicos quânticos.
Um paralelo interessante, fora do universo quântico, é com atirar uma moeda ao ar para decidir no cara ou coroa. Enquanto ela está no ar ela é cara ou coroa?
Na realidade, como no caso do gato, ela não é uma coisa nem outra e só ganha significado quando cai no chão e alguém olha pra ela.
Da mesma forma que a árvore do mondô zen: “Se uma árvore cai na floresta e ninguém ouve, ela faz barulho?”
“Barulho” é um conceito. Precisa ter alguém ouvindo para dizer que houve barulho. Caso contrário ela fará ao cair o fenômeno físico de “som”.
A intenção de Schrödinger era demonstrar a complexidade da física quântica levando ao mundo macroscópico, que exatamente o que fazemos quando estamos lidando com a cura quântica ou qualquer uma de suas variações.
Diversos físicos tentaram resolver este paradoxo, mas uma delas, os mundos paralelos, proposto pelo físico Hugh Everett III, onde existiriam dois universos paralelos, um em que o gato estaria vivo e outro em que estaria morto.
Esta explicação é bastante citada pelos praticantes de qualquer modalidade de cura quântica e por escritores de ficção científica.
O Pensamento Quântico
Há uma filosofia quântica sendo elaborada em virtude do terremoto que as suas descobertas provocaram na física e em outras ciências.
Não pretendo esmiuçar aqui, mas seria bom nos determos um pouco em alguns aspectos.
O pensamento ocidental tem como um dos pilares a lógica aristotélica, que o paradoxo do gato de Schrödinger coloca à prova, já que o postulado máximo desta lógica é o princípio da contradição: A é A e não não-A.
Uma outra coisa que influencia a filosofia é a impossibilidade de chegar à menor das partículas. Por exemplo:
- descobriu-se que os objetos do mundo real eram formados por átomos, que significa não-divisível
- algum tempo depois, se descobriu que o átomo não era uma bolinha sólida, mas um núcleo sólido cercado por uma nuvem de elétrons.
- mais adiante, descobriu-se que o núcleo é formato por prótons e nêutrons.
- e, recentemente, que estas partículas são formados por quarks
Isso sem contar que no meio do caminho se descobriu uma infinidade de outras partículas.
A Quântica e as terapias
Se a própria física e não conseguiu um consenso sobre os fenômenos quânticos, o que dirá as outras ciências, a filosofia e as terapias alternativas.
Em algum momento alguém usou a física quântica para explicar algum fenômeno psíquico (isso não é nenhum pecado, alguns físicos até concordam) e de repente isso se alastrou e transformou tudo em quântico e mesmo quem sabe que o que está praticando não tem nada a ver com física quântica coloca quântica no nome.
Mas o que estaria certo ou errado nesta classificação?
Com certeza em algum momento alguém vai fazer uma separação do joio do trigo, mas, no momento convém seguir alguns critérios.
Há duas maneiras de ver a física quântica numa terapia. A primeira delas é como uma excelente metáfora. É comum usar-se metáforas com princípios de uma ciência em outra, por exemplo, o uso de termos da hidráulica para explica fatos econômicos, por exemplo, temos fluxo de caixa, inundação do mercado, etc..
Assim, voltamos ao gato de Schrödinger. Se depende da minha observação um fenômeno físico, posso fazer o mesmo com minhas próprias emoções ou meus próprios problemas. Assim poderíamos ter uma Psicologia Quântica, que busque tirar o paciente de uma visão aristotélica e preto e branco, para uma visão mais maleável da realidade.
Usar a física quântica para explicar coisas que sabemos que funciona, mas ainda não há uma teoria definida para explicá-la na ciência ocidental. É o caso da Acupuntura ou o Reiki (precursores da Cura Quântica), se bem que um praticante tradicionalista destas técnicas torcerá o nariz para a palavra “quântica”.
Usar a física quântica para explicar os corpos sutis (mental, astral, emocional, etc..).
A física quântica pode trazer uma mudança da visão de mundo (eu acho esta a contribuição mais importante), de um mundo sólido e determinista para um mundo de possibilidades, já que a estabilidade aparente do mundo macroscópico é fruto de um mundo microscópico altamente mutável e instável.
Noto que a maioria dos pesquisadores e terapeutas da cura quântica aprendem, intuem ou “canalizam” o que sabem, sem ter uma base para pelo menos discutir os conceitos da física quântica envolvidos no seu trabalho. Sabem que funciona, tem até casos clínicos para demonstrar, mas na hora de explicar, tem dificuldades. Já vi uma entrevista com um médico, que praticava medicina quântica há anos, onde ele simplesmente rodeou o tema sem explicar nada, principalmente no que interessava, em que diferia sua medicina da medicina tradicional. O fato é que havia diferenças sim, mas ele não soube apontá-las e onde entraria a física quântica no que ele fazia.
É claro que podemos continuar a usar os termos da física quântica em nossas terapias, mas seria bom sabermos do que estamos falando. Certa vez um vendedor tentou-me vender um aparelho para uso em cromoterapia que usava cristais para aumentar a eficiência do uso de uma luz colorida. Ele me dizia que aquele aparelho usava conceitos da física quântica, e começou a explicação dizendo: “existem duas partículas usadas nas terapias quânticas, o quantum e o fóton.” a partir dali ele não conseguiu me vender mais nada. Por que? Porque quantum não é uma partícula, mas uma medida de energia.
Outro erro a evitar, é tentar trazer a física quântica para uma terapia que você já pratica, sem que realmente tenha ocorrido alguma mudança. Vamos supor que eu tivesse comprado o aparelho e passasse a chamar o que eu pratico cromoterapia quântica só por causa do aparelho. Uma pergunta sem resposta ou com uma resposta equivocada pode fazer cair a nossa cara.
Você não precisa estudar física, mas ler alguns livros ou artigos de divulgação científica ajudam, principalmente de físicos simpáticos ou, pelo menos, tolerantes com as terapias que praticamos.
Conclusão
Apesar do uso indiscriminado do termo quântico em várias terapias, às vezes sem fundamento, não devemos descartá-lo, sem antes procurar algum embasamento. Devemos estar cientes que o que está em jogo é nossa credibilidade enquanto terapeutas.
A moda passará e, daqui alguns anos, quando virmos o termo quântico em alguma terapia saberemos que realmente a pessoa sabe o que faz.
Espero que você seja um deles.
Leituras recomendadas
Alice no País dos Quantum. Robert Guilmore. Editora Zahar.
A Cura Quântica. Deepak Chopra. Editora Best Seller.
O Universo Auto Consciente. Amit Goswani. Editora Aleph.
Parabéns, amigo, pela republicação da sua novela no Recanto das Letras. Vou dar uma visitada.
Quanto ao Schrodinger, esse experimento mental na realidade é uma critica em se tentar levar os conceitos do mundo das partículas para o macro universo. Na realidade, este experimento é impossível de ser realizado na prática. Pois se colocarmos qualquer instrumento de medição no interior da caixa, teremos um “observador”. E já há um observador: o próprio gato. O que o que se supõe que ocorre na pratica é que todas as coisas do universos entre um instante e outro são uma onda de possibilidades e no momento que ocorre uma “observação” (o instante acontece), uma das realidades é colapsada. Uma explicação interessante disso, fora deste contexto, aparece em Game of Trones, quando Little Finger explica sua maneira de pensar à Sansa Stark, algo como:
“Eu tento ver o maior número de possibilidades do que pode acontecer e ajusto meu comportamento ao que acontece de fato”.
Mais maluco ainda seria Hugh Everett III, que propôs como saída deste paradoxo a existência de múltiplos universos. No caso, existiria um universo onde o gato estaria vivo e outro onde estaria morto. Nós apreciadores da Ficção Científica temos muito que agradecer A Schrodinger e a Hugh Everett III.
No meu entender esse Schrodinger é maluco. Só porque ele não verifica se o gato está vivo ou morto não impede que já exista o fato objetivo. Existe um Ser Supremo que sabe de tudo. Alvaro, minha novela que você prefaciou, “A cidade do terror”, está sendo reeditada em capítulos no Recanto das Letras. Abraços.